sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Queimando o filme



Clássicos do cinema em versões mais realistas e factíveis. O texto a seguir pode conter termos chulos e ofender pessoas frescas que não sabem lidar com sarcasmo ou imaturidade gratuita.
De volta para o futuro
Estamos no ano de 1985. Na casa dos McFly as coisas continuam na mesma rotina de anos e anos. George, o pai, segue frustrado com seu emprego deplorável de vendedor de planos da AT&T. Para piorar, ele é alvo de piadas e humilhações do seu chefe e vizinho Biff Tannen. Lorraine, a mãe, segue cada vez bebendo mais, o que a acaba a deixando fora de forma, motivo para beber mais e mais, formando assim um círculo (literalmente) vicioso. Os dois se conheceram quando Lorraine atropelou George na época da faculdade. Ainda assim, mesmo com essa história sendo contada frequentemente para os filhos, sempre existiu a impressão de que os dois escondiam algo sobre o acontecimento, sobre a passividade de George com Biff e o motivo da bebedeira de Lorraine.
Dos três filhos do casal, Marty é o mais safo de todos, o que não é digno de muito reconhecimento. Dave é um retardado que só sabe ler quadrinhos de super-heróis, jogar pinball na lanchonete da esquina e comprar bonequinhos do Falcon. Ele tem mais de dezoito anos. Linda está no décimo ano na faculdade local do governo. Ela começou fazendo sociologia, depois foi para comunicação, passou para filosofia, transferiu para letras e atualmente está fazendo apenas disciplinas eletivas enquanto aguarda a abertura do curso de responsabilidade sócio-ambiental em países comunistas. Ela é bolsista e ainda não se formou em um curso sequer.
Voltando ao Marty, ele está na escola e tudo que sonha é que sua banda faça sucesso, mesmo com um vocalista que tem temperamento imprevisível e notórios problemas em manter o peso. Seu único incômodo era com o nome da banda, motivo que o fazia discordar dos companheiros. Em um ensaio, depois de muita discussão por conta do nome, Marty é informado que será substituído por outro guitarrista caso não aceitasse o nome Guns and Roses.
Sem banda, Marty passa a ficar cada vez mais amigo do Dr.Emmett Brown, um engenheiro esquizofrênico, hiperativo, dislexo, desempregado e marginalizado pela comunidade científica por ser viciado em LSD e mescalina. Frequentemente Marty ia ao que Dr.Brown chamava de laboratório, uma garagem escura e suja, entulhada de quinquilharias que não funcionavam e coisas que um dia funcionaram, mas também foram desmontadas e não funcionam mais.
Certa noite, a pedido do cientista demente, Marty vai ao estacionamento de um mercado local. Lá encontra o Dr.Brown encostado em um DeLorean cheio de gambiarras. Com os olhos vidrados, fala acelerada e mãos nervosas, o criador explica ao jovem do que se trata a criatura. É uma máquina do tempo. O veículo que agora é movido a plutônio, depois de acertada a data destino no teclado de um Odyssey instalado no painel do carro, ao alcançar 120km/h viajaria no tempo. Enquanto Marty do lado de dentro do carro estava fascinado com aquela maravilha tecnológica e o Dr.Brown do lado de fora encenava seu processo criativo com gestos exagerados e movimentos cartunescos, uma van com alguns traficantes locais se aproxima. Eles querem cobrar uma dívida que o engenheiro adquiriu comprando supositórios alucinógenos. As coisas então saem do controle, os traficantes matam o desvairado cientista e Marty, assustado, foge com o carro que, ao alcançar a velocidade de 120km/h, viaja para a data que tinha brincado de colocar: o dia em que seu pai e sua mãe se conheceram em 1955.
Voltando no tempo, é óbvio que o local não seria igualmente um enorme estacionamento de mercado. Então, completada a viagem, assim que se materializa, o carro se esborracha em uma árvore. É perda total, nem adianta tentar fazer com que ande novamente. O motor voou longe, o Odyssey ficou em pedaços e o plutônio vazou transformando os pobres répteis que lá próximo estavam em tartarugas ninjas mutantes. Sem opções, ele cobre aquele monte de ferro retorcido com folhas, galhos e mato seco, seguindo a técnica de construção de cabanas aprendida em A Lagoa Azul que até então era para ele um lançamento, para depois andar até a cidade.
Chegando ao centro da cidade, Marty passará por diversas situações sobre coisas e costumes da época para mostrar que os roteiristas são antenados, até que enfim algo que preste vai acontecer. Andando pela calçada, ele vê seu pai, agora mais novo, atravessando a rua e depois sendo atropelado por sua mãe, uma gostosinha diga-se passagem. Ele chega a se recostar na parede de uma loja para mais à vontade presenciar o que seria a cena mais romântica da história de sua vida, e o que acaba acontecendo é um grande circo. Vários homens começam a cercar o carro acusando Lorraine de tudo e mais um pouco. Ouvem-se gritos coletivos de “piranha barbeira”, “vai pilotar fogão”, “mulher no volante, perigo constante”, “mulher no pedal, ameaça mortal” e um tímido ao fundo “eu comeria fácil, ela e o atropelado”. Marty, que esquecera ter voltado para uma época de predominância machista, fica assustado com aquilo tudo e não sabe o que fazer com medo de estragar o futuro, até que a polícia chega junto de uma ambulância. Pai George vai para o hospital, mãe Lorraine vai para a delegacia. Sabendo que o pai vai sobreviver, ele opta por seguir a ambulância usando um skate roubado de um adolescente. Essa cena em particular é assumidamente absurda, mas se faz necessária pela gravadora patrocinadora que queria uma oportunidade para colocar a música hit do filme.
O caos está formado na delegacia. Uma turba de homens coléricos pede a cabeça da menina que, ao invés de estar em casa desenvolvendo seus talentos domésticos, colocou em risco a vida de um rapaz ativo capacitado para sustentar uma família em um futuro próximo. Marty opta por ficar no meio daquilo tudo por cautela. O tumulto é tamanho que ninguém nota que ele veste um casaco do Boston Celtics com o número 33 e o nome Larry Bird gravado nas costas em comemoração ao título de 1981. Aqueles homens conservadores que são fãs de esportes não percebem, os repórteres sequer reparam e o roteirista é demitido depois disso.
Horas depois Lorraine é finalmente liberada após pagamento de fiança. Marty fica surpreso ao saber que quem pagou a fiança é a mesma pessoa que vai levá-la para casa: o jovem Biff Tannen. Indignado, Marty resolve seguir os dois com seu skate para que possam tocar a parte restante da música hit que ficou incompleta na primeira cena que era muito curta, mesmo para uma música pop de três minutos e meio.
Escondido no jardim e próximo à janela do quarto de Lorraine, Marty ouve a conversa dela com Biff. O que ele ouve é perturbador, aparentemente os dois são namorados. Incrédulo e disposto a confirmar o contrário, ele se levanta um pouco para enxergar o que se passa no quarto e flagra os dois se beijando. Ele se sente mal com aquilo, volta a se abaixar e tenta controlar a mente que está em uma velocidade descontrolada insinuando várias besteiras para ele. São longos minutos ali abaixado com os piores pensamentos possíveis. Como era possível a sua própria mãe, aquela santa criatura alcóolatra, trocando beijos com o rapaz que um dia seria o homem que humilharia seu pai dia após dia? Ele não poderia se conformar com aquilo e decide então surpreendê-los. Ao se levantar, o que era antes um pesadelo vira uma pequena imagem desconfortável perto do que presenciava. Sua mãe aplicava um guloso boquete em Biff. Ele passa mal, vomita no vidro da janela, desmaia e é sorrido por Biff com pau ainda de fora, das calças e da janela.
Mais tarde, com a consciência retomada, Marty está no quarto de Lorraine que ainda está acompanhada de Biff. Acontece uma longa e cansativa cena de diálogo entre eles até que seja explicado quem ele é e o que fazia ali. Todos convencidos que ele era um estudante de outra cidade perdido, o casal resolve ignorar o fato de ele ser um total estranho e começam a confabular em sua presença. Aparentemente, Lorraine seria condenada por atropelar George e a única solução era conquista-lo, para que assim ele retire a queixa. Martin, cada vez mais atordoado com a sequência de porradas que recebia horas após horas daquele dia nefasto, se levanta da cama, inventa uma desculpa e vai embora à procura do Dr.Brown.
Quando abre sua porta, antes mesmo que o desconhecido até então Marty pudesse falar algo, o Dr.Brown já antecipa “Desista, rapaz! Estou proibido de fabricar metanfetaminas.”, para a surpresa do garoto que precisa de muito esforço para conseguir a atenção de um agitado e confuso Dr.Brown, que estranhamente aparenta ter a mesma idade de 30 anos depois, provocando mais tarde a demissão do segundo roteirista. Após alguns argumentos de Marty e muitos olhos esbugalhados do cientista aloprado, o rapaz consegue convencê-lo a ir com ele até o DeLorean destruído. Chegando lá, Dr.Brown fica espantado com tamanha tecnologia e sua capacidade de desenvolver algo do tipo. Marty então explica seu problema, tudo que aconteceu e pede para que ele conserte o carro para que possa voltar para o tempo de onde veio, tempo que aparentemente não era tão cruel com ele. Infelizmente Dr.Brown não tem boas notícias para ele:
“Rapaz, isso nunca vai ser refeito! Você está falando com um imbecil desgraçado que passa o dia todo fumando haxixe e tocando punheta para encartes de lingerie que furto da caixa dos correios dos vizinhos. E você acha que é fácil achar plutônio? Ainda mais depois que aqueles porcos da Casa Branca encheram a cabeça daqueles amarelos nojentos dessa merda radioativa na segunda guerra? Esquece! Não tem como! Mesmo que conseguisse comprar plutônio no mercado, precisaríamos consertar o carro. Só que não existe tecnologia atual capaz de substituir aquelas peças. O mais perto desse carro que posso conseguir é um Lincoln Continental 1948, uma banheira gigante que pesa mais que o Titanic e precisaria de uma rodovia inteira para alcançar aquela velocidade. Rapaz, sinto muito por você. Lamento que sua mãe seja uma piranha que vai casar por conveniência com seu pai e manter um relacionamento secreto com aquele brutamontes. Já cogitou a possibilidade de ser filho desse tal de Biff? Pelo que me falou, você é bem diferente de seus irmãos. Você consome drogas? Deveria! Tenho uns adesivos mágicos na minha garagem. Quer vender comigo? Podemos fazer uma grana boa, o que acha?”
O restante do discurso do Dr.Brown é ignorado por Marty. Ele está totalmente desconcertado. Era como se tivessem tirado o chão debaixo dele. Marty estava em sua cidade e perdido ao mesmo tempo. Ele tinha pais e ainda assim era órfão. Estava preso naquela época para sempre e graças a dois doutores Emmett Brown. Primeiro, o do futuro, ou ex-presente, que o meteu em toda essa confusão. Segundo, o drogado e imbecil do passado, ou atual presente, incapaz de resolver seu problema. Não existia escapatória, ele tinha de recomeçar a vida.
Desgostoso com tudo, ele resolve ignorar Lorraine, George, Biff ou qualquer outro vínculo com sua família original. Naquele momento ele se tornara apenas Marty, um misterioso rapaz sem origens que arriscaria a vida no mundo da música. Para isso, ele ficou por um semestre inteiro vendendo drogas alucinógenas fabricadas pelo Dr.Brown em sua garagem para juntar dinheiro e produzir seu próprio disco. Com o primeiro objetivo concluído, ele planeja se apropriar de todas as músicas que eram sucesso na sua época para assim mais rápido alcançar o sucesso.
Dois meses depois de pagar do seu próprio bolso o lançamento do seu disco, Marty voltava a vender drogas para o Dr.Brown. Aparentemente a década de 50 não estava pronta para uma banda chamada Menudo que tocava músicas como Super Freak, Like a Virgin, Kung-Fu Fighting e I Want to Break Free.