quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Cretinice homeopática

Deixe-me explicar porque alguns dos seus pedidos não são realizados. E acredite, é bem simples de se explicar. Basta apenas fazer uma breve reprodução da sua última noite do ano.
Você chega à Praia de Copacabana por volta de oito da noite com aquela flor Copo de Leite que comprou no Extra. Assim que chega, começa a maratona de bebidas. Fica até dez horas falando sacanagem com os amigos. Depois, começa a reclamar do calor, da vida, que está cheio, que as pernas doem, que foi injusta a final do The Voice, que o Pedro Paulo não te liga mais e que devia ter trazido mais biscoito Fofura. Por volta de onze da noite, você está bêbada, assume que tem conta no Tinder, que aquela verruga que nasceu perto da vagina há quinze dias agora purga um líquido estranho, que votou na Dilma, que tira foto com cerveja importada, mas só bebe Itaipava, que todo dia come quatro Paçoquitas de sobremesa e que traiu o Pedro Paulo por criancice. O relógio finalmente marca meia noite, você fica vinte minutos vendo uma queima de fogos que deveria formar alguns desenhos no céu, depois gasta mais vinte minutos tirando fotos com amigos, estranhos, selfies e, por fim, perde mais vinte minutos tentando postar as fotos no Facebook. Depois disso tudo é que você se lembra da flor e resolve lançar a bendita no mar para fazer um pedido. E como não bastasse ser a sua última prioridade, a flor está murcha, pisoteada e parecendo um rabanete. Honestamente, você deveria agradecer por Iemanjá não pedir por um raio em você quando levantasse o pau de selfie novamente.
Feliz 2015!

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Cai na real: Contos sobre a rotina para quem acabou de chegar


Conto anterior da coleção: Matrícula

Almoço e mentiras
Justiliano odiava seu nome. Para amigos, colegas de trabalho, até atendentes de central telefônica, era sempre Jota. Poucos sabiam seu real nome. Aliás, poucos sabiam sobre sua vida. Um dos que fugiam à regra era Wallace, que ele chamava gentilmente de Uólace. Não era apenas o verdadeiro nome de Jota que Wallace sabia, ele também era seu confidente para tudo, mas, principalmente, era seu álibi para suas atividades, digamos, indiscretas:
– Alô!
– Fala aí – respondeu o Wallace. - Fala, Jota!
– Seguinte, vamos almoçar hoje.
– Beleza – disse Wallace. – Que horas passa aqui?
– Não, sua besta – Jota falou pausadamente. – Va-mos al-mo-çar ho-je!
– Eu en-ten-di – respondeu Wallace. – Que ho-ras?
– Porra, Uólace! Presta atenção!
– O que foi?
– Nós vamos almoçar hoje juntos, mas você não vai! Entendeu?
– Ah, tá – finalmente Wallace entendeu e riu – Ok, captei.
– Já sabe, né? – Jota fez uma pausa. – Se te ligar, almoçamos juntos.
– Tudo bem.
– Falou então.
– Peraí – Wallace interrompeu o Jota.
– O que foi?
– Onde iremos?
– Como assim?
– Para confirmar – Wallace falou com uma voz enfadonha. – Caso contrário podemos ser pego na mentira.
– Entendi – Jota fez uma pausa dramática – Em Ipanema!
– Boa! Ipanema! Gostei!
– Beleza – disse o Jota se despedindo. – Valeu então!
– Não! – Wallace mais uma vez interrompeu a despedida.
– O que foi?
– Mas onde em Ipanema?
– Faz diferença?
– Claro que faz. Vai que você conta esse detalhe para ela e não para mim – explicou Wallace. – Um dia podemos comer novamente lá, ela comentar algo e eu ficar com cara de panaca.
– Você já tem cara de panaca, Uólace – Jota falou rindo. – Sei lá. No Francesco!
– Está louco? Lá é muito caro!
– Mas você não vai pagar coisa alguma, demente!
– Não importa – Wallace discordou. – Ela sabe que sou muquirana. Nunca pagaria uma fortuna em um almoço.
– Está bem! Na Boi Torrado então.
– A churrascaria?
– É!
– Não – respondeu Wallace. – Não mesmo!
– Ora, por quê?
– Queria comer uma massa.
– Ah, Uólace – Jota se irritou. – Você pode comer massa.
– Lá não tem massa!
– Mas você não vai comer lá, sua múmia!
– Ah, mas mesmo assim – Wallace falou com a voz elevada. – Comi carne a semana toda.
– E daí?
– Ora, e daí que só de pensar em comer mais carne fico com azia – Wallace fez uma pausa. – Desculpe, arrotei. Não disse? Preciso de massa hoje!
– Mas que coisa, Uólace – Jota se zangou. – Sério mesmo?
– Você é engraçado! Quer que eu minta e ainda passe mal? – ele ficou em silêncio por alguns segundos. – Nada disso.
– Está bom, seu fresco. Vamos na Mama Bologna!
– Ah, agora sim! Lá tem um talharim al dente sensacional!
– Com molho branco ou bolonhesa?
– Branco – respondeu o Wallace.
– Com bastante queijo ralado em cima e pedaços de cogumelos?
– Isso!
– MAS NÃO VAI COMER – gritou Jota.
– Como assim?
– NÃO VAI! ISSO É UMA MENTIRA. ESTAMOS COMBINANDO A BAITA DE UMA MENTIRA. VAMOS DIZER QUE FOMOS ALMOÇAR LÁ, MAS NA VERDADE VOCÊ VAI COMER NESSA PORCARIA DE RESTAURANTE A QUILO QUE TEM EMBAIXO DO PRÉDIO QUE TRABALHA, PORQUE É MUITO PREGUIÇOSO PARA IR ALMOÇAR LONGE.
– Ei!
– EI, NADA – interrompeu Jota que agora fala calmamente – Estamos entendidos? Fomos almoçar em Ipanema, na Mama Bologna e você pediu o maldito talharim ao molho branco. Entendido, Uólace?
– Ah, tá! Vai aprontar mesmo. Está muito estressado.
No final de semana seguinte, Jota e sua esposa passeavam pela orla quando encontraram com Wallace sentado em um quiosque. Papo vai, papo vem. Aquelas coisas de sempre. Até que a esposa de Jota convidou Wallace para acompanhá-los para almoçar. Ele topou. No caminho, ela perguntou:
– Por que não vamos naquele restaurante que vocês comeram juntos outro dia?
– O Mama Bologna? – perguntou Wallace.
– Sim – respondeu a esposa de Jota. – Ele disse que lá tem um talharim maravilhoso.
– É? – Wallace se espantou fazendo uma enorme cara de desdém ao mesmo tempo.
– Não é bom lá? – perguntou a esposa.
– Até que é – respondeu Wallace. – Mas naquele dia, seu marido, fresco toda vida, não topou a minha ideia de ir ao Boi Torrado. Sabe como ele é com carnes?
– É fresco mesmo – falou a esposa apontando para Jota que permaneceu calado.
– Insisti muito, mas ele disse que não ia de jeito algum lá.
– E você aceitou isso assim? Como ele pode te obrigar a comer em outro lugar, Wallace?
– Ah, ele prometeu que iria compensar pagando um almoço no Francesco qualquer dia desses.
– Eu disse isso? – perguntou Jota espantado.
– E tudo isso porque disse que ele é muito preguiçoso para almoçar longe do trabalho. – Wallace foi novamente contundente.
– O QUE? – o Jota se espantou novamente.
– Não fico surpresa com isso – relatou a esposa. – O Jota é tão preguiçoso que, se não tivessem inventado o controle remoto, ele ficaria sem ver televisão.
– Bem colocado – Wallace concordou rindo. – Você acredita que ele disse exatamente “você não vai pagar coisa alguma, demente”?
– Ora, que ótimo, senhor generoso – falou a esposa olhando para Jota. – Um pouco indelicado, mas generoso. Então vamos hoje, é aqui perto.
– Boa ideia – Wallace se animou. - Olha só que legal, Jota!
– Muito legal – Jota concordou debochando. – Você é a mentira mais cara que já vi!
– O que disse, Jota? – perguntou a esposa.
– Disse que o Uólace é o amigo mais caro que já tive.
E lá foram eles almoçar no Francesco. A conta passou dos trezentos. Wallace saiu bem alimentado e satisfeito por ter comido em local tão sofisticado onde jamais imaginaria ir antes. A esposa ficou contente com o belo programa de final de semana. Já Jota, bem, ele saiu algumas centenas de reais mais pobre, mas com a certeza de que mentira pode até não ter as pernas tão curtas assim, mas usa uma saia cara de seda importada para cobri-las.


Próximo conto da coleção: Silêncio

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Detran anuncia novas exigências

Interrompemos nossa programação para... AI PORRA! MEU PÉ, CARALHO! PRESTA ATENÇÃO!
No aguardado último boletim do ano, o Detran anunciou diversas mudanças na legislação vigente. Dentre as novidades, está a obrigatoriedade de vistoria anual de carrinhos de supermercado. O gerente de comunicação da instituição afirmou que tal medida não é para angariar mais impostos, mas para evitar acidentes. A lista de itens a ser vistoriados é extensa, destacando-se o alinhamento deles.
- Nossa expectativa é que, com essa nova medida, os acidentes diminuam em 38% - afirmou o gerente Claudio Barbeiro para depois trazer números atuais. – Atualmente, existe uma média anual de 835 fraturas de calcanhares e 433 casos de mindinhos decepados. Precisamos reduzir estes índices.
O representante da Associação de Supermercados acha que a medida é impossível de ser atendida pelo Detran, tendo em vista que a instituição sequer consegue dar conta das vistoria dos veículos tradicionais. O gerente do Detran rebateu os argumento em seguida:
- Sabemos que precisaremos aumentar nosso contingente de enroladores... Digo... Colaboradores! Para isto estamos chamando mais apadrinhados... Digo... Contratados!
Ainda com a promessa de aumentar o efetivo, o representante da Associação dos Supermercados afirmou que é uma medida unilateral que não atingirá todos os envolvidos nos supostos acidentes que o Detran pretende reduzir. Para ele, a medida precisa envolver mais pessoas.
- E os carrinhos daqueles ajudantes de feira de rua? Aquilo é muito mais letal que um carrinho de supermercado – disse o representante Pedro Leite Vencido. - E aquelas velhas tresloucadas com seus carrinhos das Lojas Bandeirantes batendo em tudo e todos? O engraçado que eles não querem fiscalizar os cruzamentos mais movimentados dos corredores dos supermercados para evitar acidentes.
O gerente do Detran afirmou que a fiscalização dos cruzamentos e a devida parada dos carrinhos para pegar produtos é responsabilidade da loja. Sobre as senhoras tresloucadas, ele preferiu não se manifestar.

sábado, 13 de dezembro de 2014

Consultor de moda

Não eram nem dez da manhã quando o barulho da porta se abrindo me acordou. Imaginei quer seria a Cláudia, então nem me dei ao trabalho de levantar da cama, tão pouco de abrir os olhos. Voltei para o fim de sono que antecedia à ressaca. Já imaginando novamente a mocinha de ontem que não me deu bola um segundo sequer, mas roubou minha atenção à noite toda, fui acordado com um grito:
- VAMBORA , HOMEM! LEVANTA ESSE CU DA CAMA!
Cláudia jamais me acordaria assim. Tinha de ser a desgraçada da Tatiana. Parada na porta do meu quarto com duas mochilas, uma nas costas e outra no chão ao lado da sua perna.
Ela tem essa mania de andar de mochila para todos os lados. E nunca é uma mochila parcialmente cheia. Não! É sempre uma mochila abarrotada de coisas quase estourando o zíper. Sua desculpa é que como fica revezando em três endereços diferentes, precisa andar com algumas coisas sempre à mão. Ah, para o inferno com esta desculpa, né? Basta deixar um kit básico em cada um dos três endereços, se planejar melhor e andaria com o mínimo. O fato é que ela tem sangue de muambeira mesmo. Daquelas que cruzam a fronteira do Paraguai com bolsas enormes de tranqueiras. Enfim, desta vez eram duas e isto não é um bom sinal.
- Porra, sua imbecil. Odeio que me acordem gritando. Odeio levar susto.
- Ah tadinho! Queria o quê? Cafuné? Uma massagem com final feliz? Uma dedada?
- Até que uma dedada cairia bem agora.
- O QUÊ?
- Viu como é bom levar susto logo pela manhã? Larga de ser imbecil e faz algo de útil na vida. Coloca comida e água para os gatos e depois troque a terrinha deles, por favor.
- Por que deveria fazer isso?
- Por que você está aqui?
- Porque preciso de um favor.
Daí fiquei parado sério olhando para Tatiana e ela fez o mesmo para mim. Ela levantou as sobrancelhas, eu repeti o gesto. Ela deu uma ligeira esbugalhada nos olhos, fiz o mesmo. Ela jogou a cabeça um pouco para frente, eu a imitei cinco vezes. Voltamos a ficar parados nos encarando até ela interromper.
- Tá já entendi, seu explorador.
Enquanto Tatiana fazia o que tinha pedido, levantei-me aos poucos e fui ao banheiro. Se existe uma coisa que é sagrada para um homem é a primeira mijada do dia. Não somente pelo alívio, mas por ser um jato respeitável seguido de toda a flatulência acumulada por uma noite inteira de sono. Sei que isso é meio escatológico, mas não deixa de ser verdade. Pode perguntar a qualquer homem.
Terminada a sinfonia e o esvaziamento da bexiga, voltei para o quarto. Tatiana já estava limpando as caixinhas. Peguei o celular, não tinha mensagens recebidas. Olhei os históricos de conversas durante a noite, nada constrangedor. Lista de chamadas feitas e recebidas estava imaculada. Aparentemente foi uma noite de poucos estragos.
- Pronto – disse Tatiana entrando no quarto e jogando uma das mochilas na cama. – Preciso da sua ajuda. Tenho uma festa hoje e quero sua opinião sobre qual vestido usar.
- É, a tal dedada agora soa bem mais interessante.
Ela riu e disse que não tinha escapatória. Em seguida pediu que me ajeitasse na cama para poder espalhar os vestidos. E não eram poucos. Não parava de sair vestido daquela mochila, quase como palhaços saindo de um Fusca. Ao final, minha cama parecia uma feirinha de estacionamento de supermercado. Ela foi então ao banheiro com um em mãos.
- Que tal?
Ela me perguntou um minuto depois ao sair do banheiro com um vestido de cor azul meio que escuro, puxando para o roxo. O tom flertava um pouco com metálico e tinha umas alças finas no ombro.
- Você está parecendo um presente da Roberto Simões.
- O que é isso?
- Sua pobre, é uma loja cara de presentes para casa.
- Ah, então isso é bom!
- Se você quiser ser um cinzeiro pretencioso que ficará guardado no alto de armário, sim.
Ela voltou ao banheiro com outro vestido em mãos. Mais um minuto e lá está Tatiana com um vestido de cor meio indefinida. Algo verde, com azul e amarelo. Tudo misturado parecendo que foi mergulhado em água sanitária. Não bastante, por cima dele tinha um tecido tipo tela com furos bem finos.
- Céus, você está parecendo uma Sininho de peça infantil de baixa renda.
- Ah para! Ele é levinho!
- Ótimo! Use-o quando precisar se pesar vestida.
Lá se foi Tatiana resmungando para o banheiro mais uma vez. Agora era um conjunto composto por uma saia preta e blusa branca de bolinhas pretas com uma gola bem grande. Ela saiu do banheiro e parou com a mão na cintura.
- É festa à fantasia?
- Não!
- Então não use. Parece secretária de filme cafona da década de sessenta. Coloca um laçarote no pescoço e vira a Lucy.
- Quem é Lucy?
- Lucy do seriado I Love Lucy.
- Você é um hétero com umas referências muito estranhas.
- A começar pelas amigas que querem que dê palpites de roupas.
Ela riu concordando e voltou para o banheiro. Mais outro minuto e lá estava com um vestido estampado de manchas que mudava a cor do fundo em diversas partes. Algo como uma união retalho de tecidos com estampas iguais, mas com cores distintas no fundo.
- Você está igual ao chão de alfaiataria.
- Jura?
- Claro! Olha esse monte de cores de maneira caótica.
- Eu gosto tanto desta estampa.
- Parece um cu de jaguatirica.
- É fofo!
- Ok, um cu fofo de jaguatirica.
Ela resmungou alguma coisa antes de entrar no banheiro. Retornou em seguida com um vestido mais comprido que os demais. Ele também era estampado, mas com referências tropicais, lembrando praia, flores, sol, entre outras coisas. Era o mais alegre de todos.
- É em um cruzeiro?
- Não!
- Que bom. Porque se fosse, iriam te confundir com uma cortina e provavelmente um marinheiro bêbado limparia o pau em você.
Segue Tatiana para o banheiro com a última peça, finalmente. Confesso que estava me divertindo, mas precisava também tirar o rabo do quarto e ver um pouco de luz natural. Nisso ela voltou com um vestido tubo preto colado no corpo, modelo tomara que caia e muito curto.
- Você está parecendo uma puta.
- Isso é bom?
- Depende do preço.
- Ah me ajuda – ela quase suplicou balançando os braços e se mexendo para os lados.
- Isso! Mais um pouco e coloco uma nota de dez no seu decote.
- Porra! Dez?
- Meu vale-alimentação está zerado.
Depois de um breve esporro sobre não estar ajudando, ela foi enfática ao dizer que eu precisava escolher uma das opções disponíveis, pois iria se arrumar na minha casa. Perguntei então como era o evento para poder melhor balizar minha decisão.
- É uma festa moderninha na zona sul. Vai uma galera meio classe-média, meio playboyzinho. Fica cheio de patricinha metidas de cocotas.
- Então o preto sem dúvida alguma.
- Ah mas você não gostou de nenhum. Deve ser o menos pior.
- E isso faz alguma diferença? Logo a opinião de um bêbado que não tem gosto nem para o que vai beber. O cara cujo pré-requisito para beber é estar líquido.
- Não importa. Estamos falando de roupa.
- Pior ainda. Onde que vale a opinião do cara que só veste jeans e camisas pretas?
- Para mim vale.
- Se te consola, te comeria com qualquer um deles.
- Jura?
- Juro, mas precisaria estar muito bêbado para tomar coragem e puxar assunto com você.
Ela se sentou na beirada da cama para não amassar os outros vestidos e com a mão sobre os joelhos lamentou aquilo tudo. Não era apenas implicância desta vez, as opções eram todas umas merdas. Só que não faria a burrice de falar isso, ou entraria em um vórtice sobre gosto e moda. Decido por matar de vez com aquilo, me levantei e anunciei que iria à padaria tomar café. Ela disse que não queria e iria ficar. Saí então do quarto quando ela pediu o que temia:
- Vai ao shopping comigo então?
- Mas nem a pau – gritei da sala enquanto abria a porta da rua.
- Você vai me deixar sozinha aqui sem ter o que fazer?
- Toque uma siririca!
- Eu estou triste porra!
- Toque com a berinjela que está na geladeira enfiada na bunda. Vai te animar.
- Isso ofende!
- Se te reconforta, a berinjela ouviu isso e também ficou ofendida.
Fechei a porta e saí. Vai ser foda quando eu voltar.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Cretinice homeopática

- Pare de reclamar, amiga!
- Mas...
- Sem mas! Você precisa agir mais!
- Mas...
- Não! Não adianta! Você precisa me escutar! A palavra é perseverança.
- Mas...
- É isso! Você precisa sair da inércia!
- Mas...
- Você precisa correr atrás!
- Não adianta, Maria Paula. O ponto de ônibus é aqui e aqui que ele tem de parar. Que coisa!

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

As desaparecidas do Medina

Interrompemos a sua programação para uma notícia que talvez não seja o que gostaria de ler hoje. Mas quem se importa com você, não é mesmo?

A polícia solucionou hoje mais um desaparecimento. O caso em questão começou com a denúncia de sumiço da adolescente Priscila Pereira Aguiar, conhecida nas redes sociais como Prika Pikachu. Ela estava desaparecida desde a manhã do dia 18 de novembro deste ano. Segundo relatos da jovem, tudo começou quando ela entrou, por volta de nove e trinta da manhã, na fila do site ingresso.com para comprar a entrada antecipada do Rock in Rio.
- Eu estava na fila – relatou. – Parecia tudo normal, mas de repente as coisas não mudavam. Eles pediam para não atualizar a página e obedeci. Achava que estava tudo correndo na normalidade de sempre.
Os responsáveis pela organização do evento reconheceram que tiveram alguns problemas no início e por isso o site apresentou alguma instabilidade. Segundo eles, o problema foi resolvido por vota de meio dia.
- O site ficou fora do ar – disse o gerente de comunicação. – As pessoas precisavam sair da fila para que pudéssemos fechar o site, organizar as coisas e reabrir novamente.
Toda confusão aconteceu quando algumas pessoas não foram notificadas para sair. O delegado responsável pelas buscas alegou que fechar o site com algumas pessoas na fila foi uma irresponsabilidade dos organizadores.
- Isso foi um absurdo – afirmou o delegado Eller. – As pessoas não conseguiam mais sair da fila. Eles depois abriram com uma nova fila e a anterior ficou esquecida em algum servidor.
Pelos cálculos, 17 pessoas estavam presas até hoje na fila do site. Entretanto, apenas 14 saíram com vida.
- O desespero foi grande – disse outra sobrevivente. – Estávamos na fila por mais de uma semana e a fome aumentou. Tivemos que escolher alguns entre nós para sacrificar e nos alimentar. Por sorte tinha uns gordinhos com cheiro de Doritos.
A organização afirmou que vai compensar cedendo um desconto para estas pessoas de 30% nos ingressos que serão vendidos no mês de Abril, caso consigam comprar no site. Quanto às três pessoas que foram sacrificadas, a produção atestou que no dia do rock bunda mole, o vocalista da banda Capital Inicial, Dinho Ouro Preto, fará um discurso homenageando todos, repletos de “cara”, “foda” e algumas palavras monossilábicas tribais.