quarta-feira, 7 de março de 2012

Eu! Eu! Aqui! Eu!


     É impressionante como as pessoas cada vez mais se encaixam na minha filosofia de labrador. Todos querem atenção. Desesperadamente! É o que os americanos chamam vulgarmente de attention whore. A nova febre é no Twitter. As pessoas não somente querem milhares de seguidores, como também querem que todos acreditem em tudo que você escreve. Criam uma personagem, acreditam que, de fato, são essa personagem na vida real e toma-lhe 140 caracteres preenchidos compulsivamente. Imagino que a maior culpa disso é que as pessoas ainda não entenderam como funciona o Twitter. Ou pelo menos como deveria funcionar.
     Resisti muito ao Twitter, principalmente pelo fato de não ter assimilado ao certo o seu real propósito. Lembro de várias charges no início que, basicamente, brincavam com o fato de existir uma ferramenta a qual as pessoas divulgariam quando iam tomar banho, comer ou cagar (não gosta do termo cagar, leia o meu conto Número 2 e timidez em Histórias Reais Inventadas por Mim). Depois que entendi, pelo menos em partes, o real funcionamento, não tive duvidas que se tratava de uma das melhores ferramentas virtuais já lançadas.
     O Twitter, no seu principal objetivo, é algo que só faz sentido quando você é um seguidor. É a melhor ferramenta para se manter atualizado de forma rápida e dinâmica sobre tudo. Quanto mais pessoas vocês segue, mais bem informado e atualizado estará. O cerne da questão está em quem seguir. Existe de um pouco, ou muito, de cada. Amigo, famosos, jornais, empresas, publicidades etc. Tudo depende de que tipo de informação você quer receber. É aí nesse ponto que acontece a maior parte do erro.
     Apesar de ser reconhecida corretamente como rede social, as pessoas, na maior parte brasileiros, confundem o Twitter como um Orkut ou Facebook. Mas, principalmente, como álbum de figurinhas. Eles tentam seguir a maior quantidade de pessoas que conhecem ou já ouviram falar como se fosse colecionismo humano. E é nesse ponto que vira a febre que inverte tudo, todos querem seguir todo mundo e todo mundo quer ser seguido.
     Aparentemente estamos lidando com uma equação matemática fácil de ser resolvida. Basta que as pessoas se esforcem ao máximo para completar o seu “álbum de figurinhas” e, por consequência, estarão todos satisfeitos com a quantidade de seguidores que possuem. E, honestamente, esse não é o ponto. Cada um faz com o seu Twitter o que quiser. O que não pode, é o cidadão que, conscientemente, tem uma vida insignificante achar que, por ter x seguidores, possui o dom da verdade absoluta sobre qualquer tema que resolver dissertar. Aí que surgem os falsos profetas, os nefastos, os picaretas.
     O mais curioso nessa história é que as pessoas de fato acreditam que estão sendo genuínas e merecem aquela atenção. Para piorar (sempre piora), seus seguidores (nessa hora o termo seguidor nunca teve um sentido tão perfeito) batem palmas (retweets) e o cara confirma a sua ideia de ser a última paçoca da latinha. Com esse novo fenômeno acabamos por ter várias situações. Todas tristes.
     A primeira é a do famoso menino minado dono da bola. Ele emite a opinião dele, retweeta (salve o neologismo) as mensagens de apoio e bloqueia os que discordam. Ah a ferramenta block. É o refinamento que todo estatístico sempre quis. Elimina qualquer possibilidade de um retorno contrário do seu estudo. Depois do block¸ somente retornos positivos e ficamos cada vez mais soberanos.
     Existem os valentes do mundo virtual. Esses empurram suas opiniões goela abaixo com argumentos ríspidos e grosseiros. São os tigres do teclado. Na vida real, bem, na vida real costumam ser frouxos. E nada contra as pessoas pacifistas que preferem conversar tranquilamente a uma discussão que pode levar às vias de fato. Também acho que essa é a melhor das opções, mas que seja assim também no mundo virtual. Comumente vemos pessoas que “xingam muito no Twitter“ sobre algo que aconteceu, mas que na hora mesmo, ficaram calados e deixaram passar. Depois do Send, aparecem os retweets e as mensagens de apoio, e o valente fica mais valente.
     Existem os que desdenham do que você fala. Noticiou algo novo, para ele é old. Mostrou uma foto engraçadinha, para ele é fake. Achou IPhone bom, virou fanboy. E por aí vai. Ele quer ser sempre polêmico, inovador e acima de todos. Por quê? Porque tem mais seguidores que você. Simples! E na leitura de quem enxerga o Twitter dessa forma, isso faz sentido. Logo, baterão palmas para ele. Por maior que seja a asneira por ele dita.
     A culpa disso tudo é da claque. O sujeito feliz que está com o álbum completo, aplaude tudo que lê e recicla o movimento de prolongar a calhordice gratuita. E digo que isso é muito fácil de se fazer, mesmo com poucos seguidores. Darei dois exemplos que eu mesmo fiz nos meus dias de troll.
     Um dia, muito entedia resolvi soltar um tweet para uma empresa que vende ingressos de shows fingindo agradecer por uma resposta a um questionamento feito: “Obrigado @qualquercoisa, a dica da meia-entrada foi perfeita. Paguei menos e nem cobraram documentação na porta!”. A empresa, por descuido ou falta de preparo, deu atenção à minha mensagem o que deixou todos os seguidores alertados. Se tivesse ficado quieta, ninguém saberia da minha mensagem e estaria um mar calmo. Mas não, foi dado continuidade e claque toda viu. Virou um fervor. Pessoas batendo palmas para a dica da meia-entrada baseada nos argumentos mais estapafúrdios possíveis. E do outro lado a empresa tentando consertar o que de fato não fez.
     Esse exemplo é o caso mais claro que como ter uma claque a sua disposição, mas não saber como controlar a ferramenta que dá acesso a ela é algo nocivo na maior parte das vezes. O despreparo de como lidar, fez com que a própria empresa supostamente tenha emitido uma informação que a própria abomina. E como a velocidade que as coisas acontecem, até corrigir o estrago foi grande.
     O outro foi com o Twitter do Lei Seca RJ. Esse é o típico picareta desenvolvido para se aproveitar do jeitinho brasileiro de lidar com as leis. Ele foi criado apenas como ferramenta para que as pessoas pudessem evitar as blitz da Lei Seca, mesmo bebendo. Ora, conhecendo o brasileiro muito bem, era questão de tempo que os seguidores se multiplicassem como coelhos. Todos querem evitar ser parado na blitz e ter o carro apreendido. Mas, como os próprios administradores dizem, a função é apenas orientar onde está a blitz para que a pessoa tenha a escolha. Não sei que escolha, mas têm.
     Enfim, com zilhões de seguidores e prestando um serviço que só corrobora com a ilegalidade, eles adotaram a postura dos bons moços que estão apenas ajudando. E a claque bate palmas. Informam onde tem blitz para parar carro irregular. A claque faz a Ola. Informam onde estão rebocando carros parados irregularmente. A claque solta fogos. E não se pode cogitar contrariá-los. Eu tentei e, supostamente, me dei mal.
    Nunca menti que os seguia. Até por dois motivos. Um, diziam as condições do trânsito. Na época a Operações de Trânsito não tinha esse serviço. Dois, não bebo, então não estaria tirando vantagem dessa gambiarra legal.
     Um dia resolvi confrontá-los. Perguntei o que acharam da notícia de um acidente ocorrido em Niterói com mortes, na qual o motorista causador estava embriagado e era seguidor deles. O block foi instantâneo. A covardia de não assumir a possibilidade de ter contribuído com aquele acidente foi assumida em um clique.
     É claro que antes a minha mensagem alcançou algumas pessoas que repassaram imediatamente. Pessoas que refletem o que lê antes de dar prosseguimento. Só que, diferentemente do caso do ingresso de meia-entrada, aqui não cabia justificativa para eles. Era um fato e ponto final. Só restaram a eles me bloquear, ignorar o que vem ao encontro da filosofia deles e seguir em frente. A claque vai atrás com os antolhos gerados pelo block.
     Agora vejamos, as pessoas não refletem mais o que fazem ou dizem por aí, por princípios ou comparação de informações. Elas medem pela quantidade de pessoas que aplaudem para ela. Com essa mesma premissa justificamos a Sagrada Inquisição e o crescimento do terceiro Reich. Longe de mim querer comparar as consequências destes dois atos com as consequências de um twitteiro (viva o neologismo) inconseqüente. Longe mesmo! Apenas quero comparar a boçalidade que as sustentou e deu continuidade. Nada mais.