terça-feira, 20 de março de 2012

Quando quem paga é dono, mas não recebe

Cemitério dos Imigrantes - Joinville - Efeito Hipnotic

     A minha primeira experiência séria no mundo corporativo foi em meados de 1999 quando trabalhava no setor segurança da informação no Cartão Unibanco. Por lá, participei de vários projetos relacionados ao uso dos cartões de créditos para compras virtuais e suspeitas de fraudes. Ainda assim, mesmo sem a grande era das transações pela internet ter se iniciado, já era robusta a quantidade de transações via telefone. Uma delas, compra de ingressos para shows. Foi nessa época que fiz o meu primeiro trabalho do qual me orgulhei. Detectar um fraudador que estava utilizando cartões de terceiros para comprar ingressos.
     Como disse, raramente a internet era utilizada para transações comerciais, logo, dificilmente teríamos “nas ruas” uma pessoa acessando as informações básicas para fraudar compras. Isso porque, naquela época, bastava apenas o número do cartão, nome gravado no mesmo e a validade para fazer qualquer compra por telefone. Pela grande quantidade de fraudes, potencialmente tratava-se de alguém de “dentro da casa”. Afinal, por lá, muitas pessoas tinham acesso a relatórios com essas informações de vários clientes.
     Concluída essa teoria, bastava apenas descobrir quem era o colega de trabalho fraudador. Não foi difícil. Até porque, aplicar o golpe nem é tão complicado, o difícil é disfarçar o súbito aumento de renda. Chegamos nele depois de uma exagerada troca de modelo de carro.
     Com o passar dos anos, as fraudes ficaram cada vez mais sofisticadas, ainda mais com a entrada da internet nesse mercado. Para evitá-las, as empresas desenvolviam procedimentos sempre mais rígidos e meticulosos para limitar as movimentações dos picaretas. E, até aí, tudo bem. Palmas para eles que, motivados pela perda financeira resultante dos golpes recebidos, por tabela, acabam protegendo o cliente também. Afinal de contas, não existe ação 100% altruísta, não é, Phoebe Buffay?
     O único problema desta história é que, em alguns momentos, certas empresas adotam regras que são inviáveis para pessoas normais que trabalham e possuem uma agenda apertada. O que acredito ser o caso de quase todas as pessoas com mais de 22 anos. E um desses casos mais irracionais é o que passei recentemente.
     Sempre comprei ingressos pelos sites tradicionais (Tickets for Fun, Ingresso Rápido, Ticketronics etc.). Em todos (leiam este todos em negrito e fonte dobrada) casos peço para entregar no trabalho. Isso pelo único motivo de ser onde estou em horários comercial. Sempre recebi pontualmente, sem maiores aborrecimentos e de qualquer empresa.
     Semana retrasada fui chamado na portaria para pegar os ingressos do show Creedance Clearwater Revised comprados na Tickets for Fun. O entregador pergunta meu nome, respondo e mostro a identidade. Ele pede a fatura do meu cartão de crédito. Não entendi o motivo de pedir a fatura. E ele explica que agora os ingressos só podem ser entregues no endereço da fatura do cartão de crédito. Ainda não acreditando no que ouço, ele me fornece o rádio para falar com supervisor dele, o qual confirma a mesma informação.
     Ora, concordo e sempre preservarei as regras para evitarem fraudes, mas isso quando o ingresso for entregue a uma pessoa diferente do comprador. O que não era o caso! Ali, era eu! O próprio comprador com cartão de crédito e identidade em mãos. Qual o risco que existiria naquele momento? Exato, nenhum.
     O entregador foi embora e liguei para a central de atendimento. Depois de duas ligações desligadas na minha cara, consegui falar com uma menina muito simpática e solícita. Pena que ela era paga para repetir frases, não para pensar. Consequência? Foi um show de contradições.
     Primeiro ela disse que este procedimento sempre existiu. Pedi que olhasse os históricos das minhas compras com eles e onde foram feitas as entregas. Exato! Todas no mesmo endereço do meu trabalho. Depois ela diz que isto é para a minha segurança. Pergunto como a minha segurança pode estar em risco quando eu mesmo recebo o cartão. Exato! Alguns segundos de silêncio e zero resposta. Peço uma solução. Ela diz que pode mudar o endereço da entrega para a minha residência. Digo que aceitaria se a entrega fosse feita fora do horário comercial ou no final de semana. Ela diz não ser possível. Continuamos em um impasse.
     Percebem o tamanho do impasse que eles criaram ao montar uma regra arbitrária como esta? Ela ainda sugere autorizar o meu porteiro a receber. Cacete! Pensem comigo no replay. O que é melhor? Entregar para o próprio comprador devidamente identificado ou nas mãos de um porteiro, mas que, ÓH, está no endereço da residência do comprador? Pois é. A regra preza pela segurança, mas não pensa no cliente.
     A ligação, confesso que, demorou mais do que devia. Até porque em algum momento, a minha irritação foi transformada em divertimento ao perceber o total despreparo de argumentar da atendente. Lembrando que isso não é culpa dela, mas da empresa que não pensa em exceções, repostas inteligentes e treinamento apropriado.
     Ela até sugere que eu retire os ingressos na bilheteria. Ora, se for para encarar fila na bilheteria não pagava a taxa de conveniência a mais, e, já teria feito isto antes. Peço para cancelar a compra que farei eu mesmo a compra na bilheteria então. Daí a surpresa. O meu dinheiro foi confiscado sem chances de resgate pela Tickets for Fun. Eles devolvem o dinheiro do ingresso, mas não da taxa de conveniência. A atendente até justifica que isso é feito porque EU estou pedindo o cancelamento do serviço. Errado! Eles estão me obrigando a cancelar o serviço. E não venham com o papo de que no site diz algo do tipo sobre cancelamento ou endereço de entrega, pois sempre comprei por lá, e recebi no trabalho sem problema algum. Não estou pedindo quebra de regra para uma possível fraude. Peço apenas que entreguem nas minhas mãos. Em qualquer site de compra no mundo a fora existe o billing adress(endereço da fatura para comprovação) e shipping adress(endereço para entrega). E isso só funciona se for o próprio quem recebe. Que no meu caso, TCHARAM, é!!!
     Não preciso dizer que o meu problema não foi resolvido, preciso? Pois é. Ainda assim, quatro dias depois uma atendente da Tickets for Fun me liga perguntando o que houve e como pode me ajudar. Juro que fiquei esperançoso, mas só por cinco minutos. Essa nova atendente é tão bem preparada quanto a do outro dia. Repetia os mesmos argumentos sem pensar nas implicações óbvias que eles acarretavam. Ficou sem resposta por várias vezes e, como resultado final, não resolveu meu problema.
     Sábado passado, mesmo após pagar uma taxa supostamente chamada de conveniência, encarei uma fila de 30 minutos para pegar um ingresso antecipadamente que já tive inclusive em mãos. E sabem o motivo? Porque não pude receber no endereço diferente da minha fatura do cartão de crédito. E sabem por que precisa ser no endereço da fatura do cartão de crédito? Porque na cabeça de algum gênio (com jota) da Tickest for Fun, esta é a certeza de que trata-se de onde moro. Só gostaria que este mesmo gênio tentasse assinar um contrato de aluguel com fatura de cartão de crédito como comprovante de residência. Ou abrir uma conta corrente. Quem sabe financiar um carro. Pois para a Tickets for Fun, isto é suficiente.
     Pois bem, agora basta mudar o endereço da minha fatura de cartão para o trabalho que para eles, minha nova residência será na sobreloja/diretoria comercial. Demais não?