segunda-feira, 19 de março de 2012

Risco de apanhar


     Prometi não falar sobre vários assuntos delicados por aqui, um deles, língua portuguesa. Contudo, na semana passada deparei-me com o relato de um colunista que, por si só, é algo tão trágico, que merece pelo menos uma nota.
     Existe no site da Veja a coluna Todoprosa (isso, junto mesmo) escrita por Sérgio Rodrigues. Não sei quem é o cidadão, tão pouco li sua coluna anteriormente. Só tive acesso por recomendação de um conhecido que se lembrou de mim ao ver o tema daquela semana: Risco de vida ou risco de morte.
     Sou do grupo de pessoas que fala RISCO DE MORTE. Acredito que a frase faz um sentido completo se dita dessa forma. Mas, antes que balbuciem algo, deixo claro que não quero discutir este assunto. Não serei prepotente ao ponto de dizer o que está certo ou errado, apenas colocarei meu ponto de vista sobre o tema e como o cidadão o abordou.
     Nunca me foi desconfortável ver uma placa com o aviso: Risco de desmoronamento. Ora, existia a possibilidade daquele fato ocorrer, portanto, nada mais justo do que avisar a sua iminência. O mesmo quando lia no jornal: Risco de epidemia. Ficava claro que se a população e as entidades de saúde não tomassem providências, a suposta doença se alastraria rapidamente de forma generalizada. O mesmo digo sobre risco de falência, risco de calote, risco de acidentes e por aí vai. Em todos os casos, o uso de risco é para avisar algo que está para acontecer. Seja bom ou ruim.
     Partindo desta premissa, de forma ingênua, pergunto qual sentido faria usar risco de vida? Afinal, seguindo o raciocínio anterior, a ideia é avisar que algo está por vir, neste caso, a morte. Ora, nada mais justo do que dizer risco de morte. Pois, assim como existe o risco da empresa entrar em falência, existe o risco de a pessoa morrer. Ou estamos falando de um morto que corre o risco de voltar à vida?
     Pois bem, novamente insisto em afirmar que não tenho a pretensão de dizer que meu raciocínio é o correto. Não! Apenas, sigo uma lógica padronizada na forma de construir a frase. Mas, se alguém tiver alguma referência bibliográfica, na qual justifica a utilização diferenciada do termo risco quando associado à vida, por favor, envie o quanto antes. Exposto o meu ponto de vista, vamos à malfadada coluna.
     O argumento principal do autor é que a expressão risco de vida é utilizada por anos pelos nossos ancestrais. Vejam bem o primeiro argumento: fazemos isso tem muito tempo. Ok, por esta premissa, qualquer atitude sexista, racista ou elitista passa a ser justificável a partir de hoje.
     O segundo argumento é que risco de vida significa risco para a vida. Ok, temos um argumento supostamente válido, contudo ele se anula ao aplicado em qualquer exemplo que citei acima. E, aí, entraríamos no mérito de discutir, seja em qual sentido, por que para vida o termo risco é diferenciado. Logo, fico no aguardo da referência bibliográfica que a justifique.
     Depois destes dois argumentos, o colunista não usa mais um exemplo sequer. Limita-se à ofensas sutis como besteirol sabichão, tese tolinha ou chamar as pessoas de incapazes de fazer análise lingüística. Não satisfeito, diz que é culpa das pessoas que mal ouviram o galo cantar e já querem chamar de ignorante quem supostamente sabe menos do que elas.
     Essa parte muito me lembra os evangélicos fervorosos e os ateus chatos que frequentam esta tal de internet. Usam dois ou três argumentos simplistas e depois partem para agressões e insultos como forma de se impor. Ou pelo menos impor seu pensamento.
     O grande curioso é que, apesar de criticar as pessoas por serem incapazes de fazer uma análise linguística, ele também não fez. Apenas citou que isto é provavelmente consequência de professores de português que fazem consultorias por aí, inclusive para a Globo (claro que a Veja aproveita para dar uma alfinetada). No mais, fica como debate de dois desentendidos de um assunto que não dominam.
     Adoraria ver um dia ele dando aulas e falando para uma mãe que, se não estudar, seu filho correrá o risco de reprovação.
     – Risco de reprovação – exclamará a mãe. – Então quer dizer que a reprovação dele está em risco? Ele pode ser aprovado?