Games e a raivinha descontrolada
O
tema mais discutido no momento é a chacina de uma família de policiais
militares no Estado de São Paulo. Tema mais recorrente, a suspeita de o filho
de 13 anos ter feito tudo sozinho.
Confesso
que não me aprofundei nem um pouco sobre os maiores detalhes do caso para
emitir uma opinião sobre. E, mesmo se tivesse, não tenho energia para esse tipo
de discussão. A minha motivação para falar sobre o assunto é o retorno àquele
batido argumento de que os jogos violentos que o menino era fã foram
potencialmente cruciais para influenciá-lo nesse tipo de comportamento.
A
ladainha começou quando os jornais, revirando os perfis de redes sociais das
vítimas, notaram que a foto principal do menino era de um personagem de jogo de
tiro, mortes, sangue e outras nojeirinhas supostamente influenciadoras de
personalidade. Daí, a coisa se desenrola (ou piora) quando um amigo diz que ele
era viciado em jogos deste tipo. Pronto, começam as opiniões dos especialistas em
nada, e normalmente esses são os mais procurados para dar entrevista. Pois bem,
já publicaram, ficou por dias nas capas de jornais, revistas e portais de
notícias. Não vou discutir, vou usar a mesma premissa e ver onde errei.
Iniciei
minha vida nesse meio dos jogos pelo Atari. Meu jogo favorito era Pitfall. Foram
anos e mais anos pulando jacarés, me balançando em cipós e, ainda assim, na
única vez que tive a oportunidade de usar um cipó, minhas mãos não aguentaram e
caí de costas no chão. Talvez por tanto jogar com aquele controle maldito do
Atari, minhas mãos ficaram frágeis demais e não suportaram tamanha aventura
selvagem.
Outra
influência, ainda sobre este jogo, que deixei escapar, foi a certeza de que
nunca me perderia. Bastava continuar correndo que chegaria ao mesmo ponto que passei
alguns minutos atrás. E, diga-se de passagem, esta influência do jogo, somada
aos cenários dos desenhos do Manda-Chuva, criava a eterna sensação que de
estamos sempre andando em círculos. Ainda assim, continuei andando por aí
prestando atenção no caminho para não me perder. Não foi dessa vez que o
videogame influenciaria de forma perigosa nas minhas ações.
O
tempo passou, trocamos as plataformas e mesmo assim continuávamos expostos às
más influências de games. A febre do momento era o chamado Nintendinho e seu
garoto-propaganda Mário Bros. Foram tardes e noites seguidas pulando, correndo,
entrando em canos, crescendo de tamanho, diminuindo novamente e por aí fomos.
Por sorte, ou por não ser tão sugestionável assim, quase não fui influenciado
por eles também. Hoje não dou cabeçada em tijolos para achar moedas, não pulo
em tartarugas que estão pelo meu caminho, nem entro em manilhas na esperança de
achar um novo mundo. De fato, uma vez ou outra tomei cogumelo, mas tenho
certeza absoluta que não foi para crescer.
Nesta
mesma época surgiu a paixão pelo futebol. Salvo engano, desperdiçava em média 8
horas por semana assistindo partidas de todos os tipos. Ironicamente, mesmo
sendo diversas vezes anunciado que a televisão influencia no comportamento da
mesma forma que o videogame, não me tornei craque. Muito pelo contrário,
tornei-me preguiçoso e, possivelmente, atrofiei alguns músculos do corpo de
tanto sedentarismo.
Mais
uma vez mudamos de plataforma, Super Nintendo e Mega Drive. Com eles, vieram Street Fight, Shadow of the Beast,
Revenge of Shinobi, Street of Rage e, o mais polêmico e
violento de todos, Mortal Kombat. Pronto, tinha tudo para ser a
criatura mais agressiva do bairro. Aliás, se me permitem a correção, o meu
prédio tinha tudo para ser o mais violento de todos. A molecada toda era
viciada nesses jogos. Excluindo dois dementes, que já eram assim antes da
televisão colorida, ninguém mais por lá foi visto arrancando cabeças,
destruindo carros por livre prazer, praticando o arremesso de estrelas ninja ou
andando com latas de lixo nas mãos para jogar nos outros no Metrô. Confesso que
uma vez ou outra fui flagrado em batalhas épicas com monstros imaginários na
piscina do prédio, mas isso estava muito mais atrelado à esquizofrenia do que
influência de games.
Assim
como a televisão, segundo muitos daqueles especialistas em conhecimentos
diversos, os filmes também eram capazes de influenciar a personalidade e as
ações do indivíduo. Não preciso entrar no mérito dos filmes que mais assistia a
partir da minha puberdade, mas se essa teoria deles fosse de fato verdade, hoje
seria a melhor máquina de sexo já vista. E, convenhamos, o que melhor sei fazer
na cama é dormir!
Enfim,
pode até ser que em algum momento essa teoria faça sentido comprovado em
alguém, mas comigo foi uma nulidade. Anos de games, filmes, televisão e não
tive um pingo da minha personalidade alterada. E, para piorar, ainda moro de
aluguel. Vejam só, foram quase duas décadas jogando Banco Imobiliário e ainda
não comprei meu hotel na Rua Augusta ou duas “casinhas” na Brigadeiro Faria
Lima! Deve ter tirado cartas de revés demais. Vai ver foi isso.