quarta-feira, 29 de março de 2017

Que sacanagem!

O programa Amor & Sexo comandado pela maravilhosa Fernanda Lima vem cada vez mais conquistando a atenção das pessoas em uma situação paradoxal. A motivação atual do programa é quebrar preconceitos sobre temas relacionados ao sexo, sejam eles voltados à opção sexual, sejam eles voltados às predileções sexuais. Voyerismo, poligamia, transexuais são um dos temas que presenciei. O paradoxo existente reside no fato de que as pessoas que estão assistindo e enaltecendo o programa são exatamente as que enxergam a normalidade nesses temas. Isto é, o programa em si, com a melhor das intenções, ainda não quebra os tabus como pretende. Os que elogiam são os que ficaram agraciados em ver um tema diferente dentre dos comumente tocados pela grade televisiva tradicional, contudo, ao mesmo tempo, um tema corriqueiro para eles. De qualquer forma, a intenção do programa continua sendo válida e, se a cada episódio, uma pessoa a mais ficar conscientizada que, o que era antes considerado anormalidade, é na realidade uma normalidade, já será uma enorme vitória.
Como disse, já vi alguns temas, mas poucos. Televisão não é o meu forte. Ainda assim, como todo (projeto de) cronista, sinto-me no dever de meter meu dedo e fazer minha sugestão. Obviamente, aqui, assumo a possibilidade de estar cometendo um equívoco ao sugerir algo já citado em episódios passados.
Desde o primeiro episódio que assisti, eu fiquei na cabeça com a possibilidade de um episódio especial com o título Amor Sem Sexo. O tema seria inteiramente voltado para as pessoas que são consideradas assexuadas. Ora, nada mais esperado que um programa que fale de sexo abordar pessoas que não gostam de sexo. Ok, talvez o verbo gostar seja muito forte e algumas pessoas que se encaixem nesse grupo se sintam ofendidas. Acredito que o mais apropriado seja substituir o verbo gostar por “não ligam tanto assim”.
Jamais cometeria o despautério de colocar assexuados no mesmo balaio que homossexuais ou transexuais, por exemplo. Todavia, seria uma injustiça negar que eles sofrem discriminação. Talvez uma discriminação mais velada, mas existente. Quem nunca julgou um colega como gay só porque ele nunca foi visto com mulheres, mesmo nunca tendo sido visto com homens? Já cogitou a possibilidade de ele apenas não curtir a coisa num todo? Ou a pior de todas, aquela em que julgamos como problemática, infeliz ou doente a pessoa que está um enorme período sem transar. Aliás, julgar infeliz uma pessoa que não transa é o maior dos equívocos que se pode cometer. É muito mais fácil encontrar uma pessoa infeliz que transa. Já imaginaram quantos homens ruins de cama existem por aí? Homens que não chupam? Mulheres que não chupam? Mulheres que transam mal? Então, vale a pena repensar esse preconceito. Inclusive, principalmente as pessoas que transam todos os dias. É tão comum ouvir alguém encher o peito e dizer com orgulho que no seu relacionamento tem sexo todo dia. Agora pensem no parceiro. Será que para ele é de fato tão prazeroso assim? Será que ele não trocaria uma noite de sexo por uma noite no sofá olhando para o teto falando sobre o nada?
Antes que alguém me pergunte, sim, sexo é muito bom. Se quero todo dia? Depende! Com quem, as condições e, o principal, a época. Sabemos bem que temos fases. Até mesmo os que possuem uma obsessão sexual têm suas fases. Existem épocas em que tudo está bem, se encaixa (não somente literalmente, seus danadinhos) e o sexo acontece naturalmente com frequência. Meu último bimestre do ano passado foi sensacional. Em contrapartida, meu início do ano foi exatamente o oposto. E em ambos estava de boa. Não me senti pressionado em um, tampouco frustrado em outro. Até o meu próprio “mentor” Charles Bukowski, conhecido como velho safado, teve sua fase inofensivo, se assim podemos dizer. Em seu livro Mulheres, ele se lembra de um período de dois anos (é, às vezes dói ler isso) sem sexo. Nada lhe dava disposição para tal, sua cabeça estava longe.
O que importa é saber desmistificar como funciona a cabeça de uma pessoa assexuada e entender que aquilo é tão normal quanto querer sexo sempre que possível. Obviamente, faz-se necessário discernir o que é não ter predileção por sexo de “estou de boa”. Você pode até aguentar um período sem sexo, afinal não é um animal que vai sair enfiando o pau em qualquer canto, ou esfregando a xoxota em qualquer objeto. Entretanto, o que os define como assexuado não é ficar um período sem sexo, mas exatamente ficar esse período sequer pensando em. É como o imposto de renda que apenas nos lembramos porque no início do ano aparece um monte de notícias sobre.
Acredito que será um grande tema a ser aprofundado: como ter uma relação amorosa sem pensar em sexo? Como existe a demonstração de carinho? Existem momentos de afeto? Como são? A coisa esquenta e a que ponto? Já pararam para pensar sobre isso? Aposto que neste momento estão tentando se recordar da última vez que apenas pensaram em sexo e estão se julgando como pervertidos. Já eu, só penso na possibilidade de receber um convite da Fernandinha Lima para falar sobre isso no seu programa.

Que sacanagem! é uma rapidinha semanal só para manter o interesse.