terça-feira, 5 de junho de 2012

As expressões inexpressivas


Words (efeito Luminance - Dystopia)
       Eu disse que jamais usaria este espaço para fazer correções de linguagens e coisas do tipo, mas não posso me abster de fazer o que mais gosto: comentar sobre expressões que não fazem sentido. Pois é, vira e mexe escuto uma expressão por aí que não faz sentido algum, ainda mais para alguém como eu, absurdamente cartesiano e ortodoxo (quase um pleonasmo forçado para enfatizar). E, com essa tal de internet, as expressões são como doenças contagiosas, se espalham e se multiplicam exponencialmente.
     Uma das expressões que acho mais controversa é a tal de “muito pouco”. “Fulano não passou de ano por muito pouco”. “Choveu muito pouco nos últimos três meses”. ”Muita pouca gente aderiu à campanha”. Ora, não me importa se está correto ou não, o que interessa é que não faz sentido. Ou é muito ou é pouco! Os dois não dá!!! A sensação é que se opta por expressões comuns por preguiça ou falta de vocabulário. Que mal tem em usar “pouquíssimo”, “em pequenas quantidades” e semelhantes? Nunca entendi a pessoa optar por falar “ele vai muito pouco ao dentista” ao invés de “ele quase não vai ao dentista” ou “ele raramente vai ao dentista”. Novamente, não tenho a pretensão de sacramentar que o termo “muito pouco” está errado. Digo apenas que não faz sentido e é menos sofisticado. Ou, se preferirem, é muito pouco sofisticado.
     Existem duas expressões usadas comumente para despedidas que para mim são de lascar. Uma, inclusive, é preferida pelos locutores de rádio, principalmente da JB FM. Tanto que a usam no Twitter também. É o tal de “vou ficando por aqui”. Ora bolotas, se o cara quer dizer que vai embora, como diz que vai ficar por ali mesmo? E o melhor é que falam “vou ficando por aqui, mas fiquem na companhia do José das Couves”. Peraí, o cara então não vai embora e me passa para outro? Ele não quer a minha companhia, é isso? O detalhe sórdido é o uso do gerúndio para uma ação inerte (ficar ali) que é exatamente oposta da que vai acontecer. Ele não “vai ficar ficando” por lá, ele vai embora de lá. Ele está indo! O máximo que consigo absorver como despedida em uma frase como aquela é que o cara está se dissolvendo. “Estou ficando por aqui. Escorrendo pelo chão. Peguem um balde e um rodo!”.
     A outra expressão muito usada em despedidas é a que mais me irrita. Não somente pela construção, mas também pelo deboche. É a tal de “deixa eu ir indo então”. Existe construção mais amorfa do que esta? O sujeito (literalmente) usa o mesmo verbo duas vezes e não consegue precisar o que está para acontecer. Ele quer ir, mas não andando, de carro, voando ou plantando bananeira. Ele quer ir... Indo! E com o seguinte agravante, ele pede (“deixa”), dando entender que você não está permitindo. Isso passa que o desespero dele é tamanho que não importa mais como ele vai, contudo que ele vá... Indo! E sabe o mais irônico disto? Quem fala esta expressão geralmente é a pessoa que está por falar pelos cotovelos e se auto-interrompe a si mesma (foi de propósito) com esta pérola. E como não se fosse suficiente, isto ocorre com aquela mãozinha no seu ombro tocando de ponta de dedos “deixa eu ir indo então”. Vai... Vai, mas vai para o inferno!